Quando uma foto revela o pior de nós

“Jesus identificava a acolhida de Deus aos empobrecidos, despojados de dignidade, fracos, com o acolhimento que devemos dar às crianças.”
Derval Dasílio 

Tenho refletido muito sobre essas palavras do Reverendo Derval Dasílio*, afinal, porque Jesus sempre estava com os invisíveis, vulneráveis, indignos? Afinal, o que devemos fazer? Devemos exaltar os que conseguem atingir objetivos por “seu próprio mérito” ou nos compadecer daqueles que não alcançaram o “sucesso” por falta de oportunidade? Daniel Martins de Barros, em texto publicado no dia 8 de setembro no Jornal O Estado de São Paulo, diz: “E se aceitarmos todo mundo? E se recusarmos todo mundo? Qual a obrigação da Europa? O Brasil já não tem pobres o suficiente para receber mais? Até que vemos uma criança morta de bruços na areia…”. Essa foto causou grande comoção no mundo todo. Quais outras teremos que veicular para nos despirmos da “arrogância do merecimento”? Do pedestal do “Eu faço por merecer”? Quando até a nossa fé é dada por Deus? Fotos como essa já foram publicadas aos montes: a menina nua que corria do ataque da bomba de Napalm; o bebê africano sendo observado por um abutre; a foto da mirrada mão da criança africana sobre a palma da mão da missionária. Essas comoções instantâneas me levam a acreditar que a empatia é uma palavra muito forte, mas pouco usada. É um sentimento potente, mas pouco ensinado.


Nesses últimos dias, a foto de Kalyl Kurdi abalou o mundo. Vimos - naquele menino - nossos filhos, sobrinhos, primos, irmãos. Vimos naquele menino um ser humano! Mas apenas naqueles cinco minutos, na tela da TV ou de um computador, apenas num share nas redes sociais. Muito me entristece a maneira como tratamos refugiados, migrantes, pobres, analfabetos, enfim, os outros. Não se trata, apenas, de posicionamento político, de ser a favor ou contra benefícios sociais, igualdade de direitos ou bandeiras políticas. Se trata de humanizar a quem queremos e desumanizar a quem nos confronta, a quem nos desagrada, a quem denuncia a nossa insensibilidade ao sofrimento alheio. 


Temos reproduzido a indiferença, a culpabilização das vítimas, ficado do lado mais forte, defendido a lei somente para o lado que nos parece justo e correto. Mas somos humanos e a nossa capacidade de julgar é tão falha que se torna uma arma cruel e eficaz. Quando olhamos para um garoto que poderia ser nosso filho, direcionamos nosso luto para uma família síria, de classe média, com boas roupas e que teve dinheiro para pagar um lugar no bote do trafico de pessoas. Mas, por outro lado, fechamos os olhos para os outros milhares que não tem dinheiro e não alcançaram um lugar sob as lentes de um fotógrafo influente. Temos um olhar compadecido-seletivo: que exclui os haitianos que vieram do Acre, que exclui as crianças nordestinas que não vão à escola, que exclui a prostituta do poço ao meio dia... Afinal, meio dia é o horário dos não dignos! Até quando evitaremos ir ao poço ao meio dia? Até quando traçaremos uma barreira que nos poupará de chegar ao excluído que não nos agrada? 


Temos criado filhos insensíveis, mal nos dedicamos a ensiná-los a estender as mãos para os irmãos e desejar a Paz do Senhor, quanto mais a estender as mãos aos pobres, refugiados e necessitados que a grande mídia vem fortemente apregoando como “folgados” . Assim é a nossa vida, é muito mais fácil ficarmos cristalizados em nossas posições ao invés de nos abaixarmos e chegarmos mais perto do sofrimento do outro. Quem são os pequeninos de Marcos 9 que o Rev. Derval nos lembra? Porque contradizemos o que está escrito em Romanos 2,11? O livro do profeta Jeremias, para mim, é um dos livros mais duros da Bíblia, que nos mostra a intransigência do homem e a maldade que habita nas vontades humanas. No capítulo 7 desse livro, o profeta Jeremias nos alerta para não oprimirmos o estrangeiro, o órfão e a viúva, da mesma forma que não devemos seguir outros deuses. Quem são os estrangeiros, os órfãos e as viúvas, senão os vulneráveis da nossa sociedade? A minha oração é que eu aprenda a amar a qualquer um assim como amo a mim mesma. Que o Senhor nos abençoe!


























* Em: https://derval2.wordpress.com/2015/09/08/jesus-e-a-grandeza-dos-pequenos-e-desprotegidos/

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